Meus Olhos

 

Eu, o menino bandido

Com meus cabelos dourados

Com meia visão de olho tapado

Seguro em meu colo

O meu pai em corpo de infante

 

Os relógios não param para nenhum de nós

Mamãe sorri com a boneca na mão

E juntos caminhamos pela velha ponte de concreto e aço

Por onde passam barcos que não voltam mais

Os paraquedistas caem em contínuo movimento

E não consigo segurá-los

O céu é cinza e já não é mais

E as velhas casas de minha infância

Já não deixam mais o velho homem parar de ombros em seus muros

Namoro a velha menina, sentado em um banco da praça

E quem me cuida é a estátua do leão que mira o muro pichado

As correntes enferrujam as fotos em preto e branco

Os cabelos emplastados de gomalina

Ao lado do chapéu inclinado pelas flores que o fazem mais feminino

Caminho com flores na mão ao lado das mulheres de minha vida

 

Eu, o menino bandido

Com meus cabelos de prata

Com visão e meia de olho tapado

Seguro em meu colo

Minhas voltas fatigantes

 

Há sorrisos em rostos de expressão deformada

A camisa negra não esconde mais a barba que não para de crescer

No rosto daquela velha senhora a fumaça de um fresco charuto cubano

O rosto de meu pai é a sombra de meu sorriso

Minha mãe é um anjo vestido de neve

Com a face coberta por uma diáfana manta de pupilas azuis

A terra me engole lentamente

Perdi meus olhares no magnífico céu argentino

Um teto de nuvens cinzas se perde infinitamente em seu movimento

Os girassóis deram as costas à luz

Já não há mais espumas nas pegadas perdidas de meus caminhos

Todos feitos de ruas úmidas e azuladas pelos enfeites de natal

Levanto voo na única coluna de vento

Que os jogos de dados me deixaram

Por entre os caules dos eucaliptos amarelos

 

Eu, o menino bandido

Com meus cabelos raspados

Com toda visão de meus olhos e meio fechados

Seguro em meu colo

Uma sentença sem clemência