O Dia Desorbitado

 

A madrugada é completamente benigna

Em sua desconcertante e plácida insônia.

As cores se acomodam

E se diluem na escuridão,

Na curvatura do eclipse,

Sem espaço nem tempo.

Do velho corredor?

Apenas confortáveis estalos amadeirados

Das profundezas alegres de minha infância.

Não há a menor possibilidade de suicídio,

Pois há desejos e cerração,

E os silêncios cortados pelo grave apito do trem

Dão a real dimensão da inaudição do mundo a ser,

Em seu constante retorno,

Que me espera pela manhã.

Desvaneço-me sem quantidades,

Nas prorrogações sem violência

De todas minhas misérias e responsabilidades,

Sem impulsos nem recuos,

Num movimento liso e doce da minha alma.

O sono em seu despotismo intratável não me faz falta.

A madrugada é benigna em seu tempo diferente,

Em suas possibilidades de desorbitação do dia,

Um exílio próprio para cartas de amor.

 

Ijuí, julho de 2013.